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segunda-feira, 28 de março de 2011

JUSTIÇA DESIGUAL


A Constituição Federal tem como um dos princípios basilares a igualdade de todos os indivíduos perante a lei. Portanto, não há distinção entre ricos e pobres, negros, brancos e qualquer outra cor ou raça, nem entre detentores dos mais variados tipos de credos ou religiões. Pois bem, aliado a tal princípio, ficou estabelecido pelo legislador Constituinte que ao Estado competia prestar assistência judiciária gratuita a todos os cidadãos que não pudessem arcar com as custas processuais e honorários advocatícios.
Para tanto, estabeleceu a criação das chamadas Defensorias Públicas, onde as pessoas pobres pudessem ser atendidas, recorrendo à Justiça em pé de igualdade com os ricos e poderosos. Trata-se, portanto, de um mecanismo capaz de igualar os desiguais, de tal forma que o indivíduo pudesse exercer sua plena cidadania, discutindo em Juízo as questões que lhe dizem respeito. 

             Todavia, na prática isso não ocorre, pois, são poucas as Comarcas onde o serviço é oferecido, e, mesmo onde as Defensorias foram implantadas, as dificuldades são imensas, já que as deficiências do sistema são visíveis. Faltam acomodações dignas, equipamentos, pessoal de apoio e até defensores, sem se falar na péssima remuneração aos que militam na área. Só para se ter uma idéia, não há defensoria nas Comarcas de Ibicaraí, Itororó, Ibicui, Iguaí, Nova Canaã e em tantas outras espalhadas pelo Estado, numa omissão imperdoável daqueles que tem o dever de cuidar do assunto, não havendo, portanto, a menor condição de se suportar o volume das questões que se apresentam.
            Na verdade, ao longo da sua história, a Ordem dos Advogados do Brasil sempre manteve um sistema de atendimento gratuito à população, em prejuízo econômico dos advogados, os quais suportaram durante décadas a responsabilidade pela Assistência Judiciária Gratuita, inclusive, em detrimento de sua própria subsistência. Destarte, a advocacia se caracterizou ao longo dos tempos por ser uma das poucas profissões, senão a única, em que seus membros trabalhavam e continuam trabalhando gratuitamente, chegando a merecer de alguém o seguinte comentário: “Em uma mesa de audiência, todos estão trabalhando e recebendo salário, pouco ou muito, somente o Advogado é que ali se encontra prestando seu serviço de graça”. Ademais, o cliente que está sendo assistido é o mais exigente possível, pois, declara sempre que o profissional está recebendo do Estado, como se isso fosse verdadeiro. O Estado, assim, fica com os louros de um trabalho para o qual nada contribuiu.
            Por outro lado, com o agravamento da crise econômica atual, onde a população pobre aumentou e, consequentemente, o número dos excluídos socialmente, houve um aumento considerável nos serviços forenses, ficando os Advogados sem condições de acompanhar na mesma proporção a assistência que vinham dando, sendo mesmo forçados a reduzi-la, o que agravou ainda mais a desigualdade social.  
            Diante de tal quadro, a Ordem dos Advogados fez gestão junto ao Governo do Estado, no sentido de que se ampliasse a Defensoria, o que não aconteceu, terminando por conseguir celebrar um convênio para que os Advogados pudessem continuar a atender as pessoas pobres, de forma que se alardeou em todos os quadrantes, tanto pelo Diário Oficial como pela “Grande Imprensa” que agora todos teriam um atendimento gratuito por parte da Ordem e às expensas do Governo. Tudo não passou de uma movimentação política e, mais uma vez, o Estado se vale dos Advogados para levar vantagem junto à população. Na verdade, não quis o Governo expandir a assistência judiciária gratuita ao povo do interior do Estado, tanto que firmou um convênio específico somente para a Capital, mas, alardeou que o mesmo abrangeria toda a população. Assim, continua o cidadão a mendigar para ter acesso à Justiça, esta caracterizada por ser excessivamente cara, pela ineficiência do seu aparelho, pela imobilidade, pelo distanciamento da população e pela subserviência e arrogância de alguns magistrados, tanto que este particular mereceu uma crítica do eminente Jurista e Professor J.J.Calmon de Passos, em discurso proferido na inauguração da sede a OAB em Salvador: “Esses meninos se formam em Direito, fazem concurso para Juiz e se sentem deuses”, numa alusão a alguns juízes novos e despreparados para o cargo.
            Com efeito, tem-se como certo o agravamento da crise na prestação do atendimento ao indivíduo pobre, distanciando-o cada vez mais de sua condição de cidadão, já que está impedido de exercê-la plenamente, em função da ausência de um Órgão estruturado e capaz de satisfazer os reclamos da população carente. Desigual continuará sendo o homem pobre, como desigual é a prestação jurisdicional do Estado, onde os ricos e a maioria dos políticos têm toda a assistência e privilégios, alguns destes inconfessáveis, em detrimento dos interesses da grande maioria da população brasileira.

Dr. Adilson Miranda, é advogado, vice-presidente da AAB–Associação dos Advogados da Bahia e presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB.

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