Esse
é um tema jurídico da maior complexidade, face o aumento considerável dos casos
que se apresentam no momento quando uma pessoa resolve se submeter a uma
cirurgia de redesignação sexual ou mudança de sexo e deseja viabilizar
juridicamente as alterações em seu registro de nascimento e demais documentos
da vida civil, tendo em vista os entraves sociais, se permanecer com seus
documentos sem a devida alteração do seu nome do sexo masculino para feminino e
vice versa. Como todos sabem, o indivíduo pode até alterar a formação do nome
de sua família, ou seja, retirando ou acrescentando o nome patronímico e o da
origem maternal, todavia, jamais poderá mudar o seu prenome, aquele que foi
escolhido pelos pais, como prescrevem os arts. 57/58 da Lei Federal nº 6.515,
de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos), exceto nos casos
extremos que expõem o indivíduo ao ridículo e nos demais recomendados pelos arts.
16/19 do Código Civil Brasileiro.
Pois bem, ultrapassadas essas indagações, há quem
entenda que com a mudança de sexo deve-se incluir no registro de nascimento a
denominação “transexual”, ao invés daquele compatível com a nova opção adotada,
já que juridicamente não existe outro tipo de sexo, ou a pessoa é do sexo
masculino ou do sexo feminino. Pensadores contrários a essa nova denominação
entendem, contudo, que basta constar apenas o sexo para o qual foi procedida a
mudança. Mas tudo isso conduz a uma discussão ferrenha entre os estudiosos do
direito sobre a condição do indivíduo, homem ou mulher, que modificou ou
redesignou cirurgicamente o seu sexo.
Vale ressaltar que o transexual é visto pela ciência
médica como uma pessoa que sofre de uma indefinição de identidade, o que gera
em si mesmo uma confusão de sentimentos, afetando não só o organismo do
indivíduo, como o seu psicológico. Nessa linha de entendimento, o sujeito nasce
com um determinado sexo biológico, mas se identifica com o que se situa no
oposto, provocando assim um conflito entre o sexo físico e aquele que julga lhe
pertencer, com repulsa ao que se apresenta em si mesmo e agindo de forma
propensa a autoimolação com a retirada ou mutilação dos órgãos com os quais
nasceu, transformando o indivíduo em uma pessoa infeliz e desconfortável, tanto
que o transexualismo mereceu ser relacionado no CID (Classificação
Internacional de Doenças). Todavia, outra discussão que merece destaque diz
respeito ao que seja efetivamente definição sexual. Uma pessoa é do sexo
masculino ou feminino pelas condições biológicas com as quais nasceu ou porque
possui um psicológico diferente? E mais, se assim for, o que se dizer da pessoa
que nasce com dois sexos claramente definidos? Seguramente que todas essas
vertentes merecem a atenção do legislador, no sentido de dotar o nosso
ordenamento jurídico de mecanismos legais que sejam capazes de disciplinar cada
fenômeno.
Com efeito, a ausência de legislação específica no
Brasil sobre o tema, seguramente, tem servido para criar as disparidades nas
decisões judiciais sobre a matéria. Desta forma, é necessário que se perquira
se o direito brasileiro acolhe ou não a possibilidade de, caso ocorra a
cirurgia de redesignação sexual, possa ser operada a alteração na Certidão de
Nascimento do indivíduo, capaz de incluir o novo sexo e as alterações no seu
nome e prenome, considerando-se que o Conselho Federal de Medicina baixou duas
resoluções a respeito, a primeira de nº 1.482/97 que foi revogada pela de nº
1.652/2002, disciplinando no âmbito de sua competência os critérios para a sua
realização, mas, tão somente, para a transgenitalização do órgão masculino para
o feminino, ficando a título de experiência científica a situação inversa.
Por fim, há decisões judiciais que se prestam a todo o
gosto, buscadas naturalmente por aqueles que recorrem à Justiça para obter
autorização para a cirurgia de redesignação sexual, e pretendem as alterações
em sua Certidão de Nascimento. Ha aquelas que são absolutamente contrárias,
como é o caso do julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais,
cujos fundamentos se firmaram em três aspectos interessantes: que haveria
impossibilidade de designação do transexual como mulher; que a legislação
pátria è pela inalterabilidade do Registro de Nascimento; e que o indeferimento
visa proteger o interesse de terceiros quanto a um futuro e eventual
matrimônio. (Apelação Cível 1.0024.07.595060-0/001, Rel. Des. Dárcio Lopardi
Mendes, 4ª CÂMARA CÍVEL, julgado em 26.03.2009, súmula publicada em
07.04.2009).
Por outro lado, posicionam aqueles que entendem
juridicamente possível a alteração do Registro Civil do transexual genitalizado,
como é o caso do julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, ao conhecer o
(REsp. 678.933/RS, Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª T., julgado
em 22.03.2007, DJ 21.05.2007, p. 571), segundo o qual deve-se atentar para o
princípio da dignidade da pessoa humana, onde estão implícitos valores
espirituais e morais que se assentam na consciência e responsabilidade pela
própria vida.
Assim sendo, não tendo a pretensão de querer esgotar a
matéria, até porque, se requer mais tempo e espaço editorial necessário,
chega-se à conclusão que valores e regras religiosos, onde se assenta a
sociedade, devem ser alvo da apreciação dos estudiosos do direito, a fim de não
serem encontrados se insurgindo contra a natureza e os desígnios do Criador.
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